Rosa Lobato Faria (1932-2010)
Rosa Maria de Bettencourt Rodrigues Lobato de Faria (Lisboa-20 de Abril de 1932 – Lisboa-2 de Fevereiro de 2010) distinguiu-se no plano cultural e literário nacional como poetisa, romancista, argumentista, cronista e actriz de teatro, cinema e televisão.
Filha de um oficial da Marinha, Rosa Lobato de Faria cresceu entre Lisboa e Alpalhão. As suas primeiras vivências são registadas num texto autobiográfico, publicado no Jornal das Letras, em 8 de Março de 2008:
“Quando eu era pequena havia um mistério chamado Infância.(…) Vivíamos num mundo mágico de princesas imaginárias, príncipes encantados e animais que falavam. A pior pessoa que conhecíamos era a Bruxa da Branca de Neve. Fazíamos hospitais para as formigas onde as camas eram folhinhas de oliveira e não comíamos à mesa com os adultos. Isto poupava-nos a conversas enfadonhas e incompreensíveis, a milhas do nosso mundo tão outro, e deixava-nos livres para projectos essenciais, como ir ver oscilar os agriões nos regatos e fazer colares e brincos de cerejas. Baptizávamos as árvores, passeávamos de burro, fabricávamos grinaldas de flores do campo. Fazíamos quadras ao desafio, inventávamos palavras e entoávamos melodias nunca aprendidas.
Na Infância as escolas ainda não tinham fechado. Ensinavam-nos coisas inúteis como as regras da sintaxe e da ortografia, coisas traumáticas como sujeitos, predicados e complementos directos, coisas imbecis como verbos e tabuadas. Tinham a infeliz ideia de nos ensinar a pensar e a surpreendente mania de acreditar que isso era bom. Não batíamos na professora, levávamos-lhe flores.
E depois ainda havia infância para perceber o aroma do suco das maçãs trincadas com dentes novos, um rasto de hortelã nos aventais, a angústia de esperar o nascer do sol sem ter a certeza de que viria (não fosse a ousadia dos pássaros só visíveis na luz indecisa da aurora), a beleza das cantigas límpidas das camponesas, o fulgor das papoilas. E havia a praia, o mar, as bolas de Berlim. (As bolas de Berlim são uma espécie de ex-libris da Infância e nunca mais na vida houve fosse o que fosse que nos soubesse tão bem).”
Aos dezassete anos, queria ser actriz. O pai deu-lhe a escolher a faculdade, em Coimbra, com tudo pago, ou o Conservatório, em Lisboa, pagando ela o seu curso com um emprego. Tomou a decisão de estudar Germânicas, mas, dada a sua força e convicção, cedo aprendeu a não desistir nunca dos sonhos.
Enveredou pela representação ao participar, na televisão, em várias séries (1987- Cobardias, 1988- A Mala de Cartão, 1992- Os Melhores Anos), sitcoms (1987- Humor de Perdição, 2002- A Minha Sogra é uma Bruxa,) e novelas (1982-Vila Faia, 2005- Ninguém como Tu).
A sua actividade como romancista inicia-se tardiamente. Como a própria escritora afirmou, aos 63 anos renasceu. Publicou os livros O Pranto de Lúcifer (1995), Os Pássaros de Seda (1996), Os Três Casamentos de Camila (1997), Romance de Cordélia (1998), O Prenúncio das Águas (1999), galardoado com o Prémio Máxima de Literatura em 2000, A Trança de Inês (2001), O Sétimo Véu (2003), Os Linhos da Avó (2004), A Flor do Sal (2005) e As Esquinas do Tempo (2008). Em co-autoria participou em Os Novos Mistérios da Estrada de Sintra e Código d' Avintes. Publicou contos infantis (A Erva Milagrosa, As quatro Portas do Céu e Histórias de Muitas Cores).
Vejamos como a escritora registou, no texto já referido anteriormente, esse período criativo da sua vida literária:
“Pois é. Eu achava, pobre de mim, que era poetisa. Ainda não sabia que estava só a tirar apontamentos para o que havia de fazer mais tarde. A ganhar intimidade, cumplicidade com as palavras. Também escrevia crónicas e contos e recados à mulher-a-dias. E de repente, aos 63 anos, renasci. Cresceu-me uma alma de romancista e vá de escrever dez romances em 12 anos, mais um livro de contos (Os Linhos da Avó) e sete ou oito livros infantis. (Esta não é a minha área, mas não sei porquê, pedem-me livros infantis. Ainda não escrevi nenhum que me procurasse como acontece com os romances para adultos, que vêm de noite ou quando vou no comboio e se me insinuam nos interstícios do cérebro, e me atiram para outra dimensão e me fazem sorrir por dentro o tempo todo e me tornam mais disponível, mais alegre, mais nova).”
A produção poética de Rosa Lobato de Faria está reunida em Poemas Escolhidos e Dispersos (1997).
Para o teatro escreveu as peças A Hora do Gato, Sete Anos – Esquemas de um Casamento e A Severa.
Foi dirigida por João Botelho em Tráfico (1998) e A Mulher Que Acreditava Ser Presidente dos Estados Unidos da América (2003), tendo trabalhado também sob a direcção de Lauro António, em Paisagem Sem Barcos (1983) e O Vestido Cor de Fogo (1986) e de Monique Rutler, em Jogo de Mão (1984).
Destacou-se, igualmente, como letrista no panorama da música ligeira e uma das mais bem sucedidas no Festival RTP da Canção, tendo obtido quatro vezes o primeiro lugar com Amor de Água Fresca (1992), Chamar a Música (1994), Baunilha e Chocolate (1995) e Antes do Adeus (1997).
Filha de um oficial da Marinha, Rosa Lobato de Faria cresceu entre Lisboa e Alpalhão. As suas primeiras vivências são registadas num texto autobiográfico, publicado no Jornal das Letras, em 8 de Março de 2008:
“Quando eu era pequena havia um mistério chamado Infância.(…) Vivíamos num mundo mágico de princesas imaginárias, príncipes encantados e animais que falavam. A pior pessoa que conhecíamos era a Bruxa da Branca de Neve. Fazíamos hospitais para as formigas onde as camas eram folhinhas de oliveira e não comíamos à mesa com os adultos. Isto poupava-nos a conversas enfadonhas e incompreensíveis, a milhas do nosso mundo tão outro, e deixava-nos livres para projectos essenciais, como ir ver oscilar os agriões nos regatos e fazer colares e brincos de cerejas. Baptizávamos as árvores, passeávamos de burro, fabricávamos grinaldas de flores do campo. Fazíamos quadras ao desafio, inventávamos palavras e entoávamos melodias nunca aprendidas.
Na Infância as escolas ainda não tinham fechado. Ensinavam-nos coisas inúteis como as regras da sintaxe e da ortografia, coisas traumáticas como sujeitos, predicados e complementos directos, coisas imbecis como verbos e tabuadas. Tinham a infeliz ideia de nos ensinar a pensar e a surpreendente mania de acreditar que isso era bom. Não batíamos na professora, levávamos-lhe flores.
E depois ainda havia infância para perceber o aroma do suco das maçãs trincadas com dentes novos, um rasto de hortelã nos aventais, a angústia de esperar o nascer do sol sem ter a certeza de que viria (não fosse a ousadia dos pássaros só visíveis na luz indecisa da aurora), a beleza das cantigas límpidas das camponesas, o fulgor das papoilas. E havia a praia, o mar, as bolas de Berlim. (As bolas de Berlim são uma espécie de ex-libris da Infância e nunca mais na vida houve fosse o que fosse que nos soubesse tão bem).”
Aos dezassete anos, queria ser actriz. O pai deu-lhe a escolher a faculdade, em Coimbra, com tudo pago, ou o Conservatório, em Lisboa, pagando ela o seu curso com um emprego. Tomou a decisão de estudar Germânicas, mas, dada a sua força e convicção, cedo aprendeu a não desistir nunca dos sonhos.
Enveredou pela representação ao participar, na televisão, em várias séries (1987- Cobardias, 1988- A Mala de Cartão, 1992- Os Melhores Anos), sitcoms (1987- Humor de Perdição, 2002- A Minha Sogra é uma Bruxa,) e novelas (1982-Vila Faia, 2005- Ninguém como Tu).
A sua actividade como romancista inicia-se tardiamente. Como a própria escritora afirmou, aos 63 anos renasceu. Publicou os livros O Pranto de Lúcifer (1995), Os Pássaros de Seda (1996), Os Três Casamentos de Camila (1997), Romance de Cordélia (1998), O Prenúncio das Águas (1999), galardoado com o Prémio Máxima de Literatura em 2000, A Trança de Inês (2001), O Sétimo Véu (2003), Os Linhos da Avó (2004), A Flor do Sal (2005) e As Esquinas do Tempo (2008). Em co-autoria participou em Os Novos Mistérios da Estrada de Sintra e Código d' Avintes. Publicou contos infantis (A Erva Milagrosa, As quatro Portas do Céu e Histórias de Muitas Cores).
Vejamos como a escritora registou, no texto já referido anteriormente, esse período criativo da sua vida literária:
“Pois é. Eu achava, pobre de mim, que era poetisa. Ainda não sabia que estava só a tirar apontamentos para o que havia de fazer mais tarde. A ganhar intimidade, cumplicidade com as palavras. Também escrevia crónicas e contos e recados à mulher-a-dias. E de repente, aos 63 anos, renasci. Cresceu-me uma alma de romancista e vá de escrever dez romances em 12 anos, mais um livro de contos (Os Linhos da Avó) e sete ou oito livros infantis. (Esta não é a minha área, mas não sei porquê, pedem-me livros infantis. Ainda não escrevi nenhum que me procurasse como acontece com os romances para adultos, que vêm de noite ou quando vou no comboio e se me insinuam nos interstícios do cérebro, e me atiram para outra dimensão e me fazem sorrir por dentro o tempo todo e me tornam mais disponível, mais alegre, mais nova).”
A produção poética de Rosa Lobato de Faria está reunida em Poemas Escolhidos e Dispersos (1997).
Para o teatro escreveu as peças A Hora do Gato, Sete Anos – Esquemas de um Casamento e A Severa.
Foi dirigida por João Botelho em Tráfico (1998) e A Mulher Que Acreditava Ser Presidente dos Estados Unidos da América (2003), tendo trabalhado também sob a direcção de Lauro António, em Paisagem Sem Barcos (1983) e O Vestido Cor de Fogo (1986) e de Monique Rutler, em Jogo de Mão (1984).
Destacou-se, igualmente, como letrista no panorama da música ligeira e uma das mais bem sucedidas no Festival RTP da Canção, tendo obtido quatro vezes o primeiro lugar com Amor de Água Fresca (1992), Chamar a Música (1994), Baunilha e Chocolate (1995) e Antes do Adeus (1997).
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